sublinhar

sexta-feira, setembro 19, 2003

Nocturno (Itinerário construído com palavras)

Eu…

Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada… a dolorida…
(…)
Florbela Espanca

Lisbon Revisited (1926)

Nada me prende a nada.
Quero cinquenta coisas ao mesmo tempo.
Anseio uma angústia de fome e carne
O que não sei o que seja –
Definidamente pelo indefinido…
Durmo irrequieto, e vivo num sonhar irrequieto
De quem dorme irrequieto, metade a sonhar.
(…)
Álvaro de Campos, in Ficções do Interlúdio (Assírio & Alvim)

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arrasto comigo o cheiro amargo da memória
mascaro os dias com palavras cujo significado perdi
mas nenhuma felicidade vem alojar-se no coração

o mundo que te rodeou continua inaudível e perdido
apodrece nas fotografias arrumadas dentro da gaveta
debaixo da roupa engomada

o aparo da caneta imobiliza por trás de cada palavra
o som dos poucos objectos com que partilhámos a vida

fica com as máscaras de tinta a morderem-te a noite
eu parto para qualquer país onde não exista
Al Berto, in O Medo (Contexto)