sublinhar

sábado, outubro 25, 2003

O sono

Quando os relógios da meia-noite oferecerem
Um tempo generoso,
Irei mais longe que os remadores de Ulisses
À inacessível região do sono,
À memória humana.
Dessa região imersa resgato restos
Que nunca chego a compreender:
Ervas de botânica simples,
Animais um pouco diferentes,
Diálogos como os mortos,
Rostos que são na verdade máscaras,
Palavras de línguas muito antigas
E às vezes um horror incomparável
Ao que nos pode dar o dia.
Serei ninguém ou todos. Serei o outro
Que sem saber eu sou, o que observou
Esse outro sono, a minha vigília. Julga-a,
Resiganado e sorridente.

Jorge Luis Borges
in Obras Completas - Vol. III (Teorema)