31. [Diário...]
Durante 26 anos estiveste sempre aqui, comigo, ao meu lado. Nunca questionei que te teria para sempre comigo: silencioso, mas ao meu lado, apoiando-me. Tivemos inúmeras discussões sobre coisas importantes e sobre coisas de nada. Agora nenhum dos dois tem forças para discutir e aguardamos em silêncio. Queria dizer-te que te amo, dizer-te com palavras mas fico calado. Estabelecemos este silêncio entre nós, coisa de homens, e agora lamento-o. Tu também o lamentas. Tu também sabes, também sentes essa incapacidade da palavra. Digo-te que te amo olhando para ti, e tu sabes que te amo, e respondes-me da mesma forma e dizes: amo-te também. Somos diferentes, muito diferentes, talvez essa diferença seja um espinho cravado entre nós. Talvez por isso, agora que o tempo falta, e nós dois choramos, eu continue incapaz de falar. E escrevo aqui, onde sei que nunca vais ler. Escrevo para construir um abrigo do medo, da saudade inscrita no futuro. Também tenho medo por ti, por saber que sofres por partires para longe de nós. Sofres muito, sofres mais do aquilo que posso ver, e por isso às vezes me escondo. Depois volto, sorrio, digo coisas alegres porque é assim que eu sou. Mas tu agora só raramente ris comigo. Eu compreendo-te. Também isso é saudade antecipada. Eu tento-me convencer a ter esperança, mas sei demasiado, toda a gente me julga forte e me conta tudo. Aparentemente elegeram-me como pilar, na tua ausência, e pedem que segure o mundo em que vivemos. Não sei se consigo, tento, tento muito. Mas à noite quando estou sozinho tenho medo, choro, sinto-me como uma criança sozinha no escuro. Não consigo ver nem compreender nada. Sim, tenho medo. Amanhã é outro dia, e sei que estão à espera que eu continue sorrindo, mesmo agora que sabem que também outras coisas me fazem triste, esperam que eu continue sorrindo. Esperam que eu continue aqui e continue sorrindo. Eu dou-vos esse sorriso com a facilidade com que vos amo. Mas quase choro quando vejo os esforços que fazes para me preservar da dor, tentas esconder de mim a dor que sentes apenas para que eu não sofra. Continuas o meu ..., continuas tu. E tenho uma vontade urgente de te dizer: Amo-te, para sempre.
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