sublinhar

domingo, novembro 07, 2004

Anatomia de um post

Muitas vezes imaginei que tu existias. Julgo agora que existes mesmo. É estranho.
Saio de casa, suponho que possa dizer que com vontade de não pensar, entro no carro e ando às voltas, escolhendo deliberadamente estradas em que posso acelerar. Nem por isso exagero.
E tudo isto se encontra de alguma forma ligado, suponho. Não que tenha muita importância, não tem.
Eu gosto das histórias dos outros, principalmente quando elas se podem contar como múltiplas imagens de um puzzle. Gosto. Não se trata de saber apenas por vontade de saber. É antes poder amar. Como se só a contradição e o mistério possuíssem a chama da paixão. Talvez não seja nada assim. Sinto mesmo que não é. O que faço é misturar muitos fragmentos e tentar encontrar uma mancha vagamente familiar naquilo que vejo. Como por exemplo: um dia descobri que duas amigas minhas que têm bastante em comum (pelo menos para mim) têm uma casa com o mesmo número da porta embora uma delas more numa rua que não tem casas suficientes, nem de perto nem de longe, para ter um extravagante número de três algarismos. Mas estas coisas acontecem. Como acontece um dia sabermos que alguém gosta de alguém e nunca chegarmos a saber se os dois vivem felizes (para sempre ou hoje, tanto faz) mas gostarmos da vir a saber. Espero que sim, mas isso também não é importante. Porque, e aqui tenho que pedir desculpa pelo excesso de palavras, temos que juntar muitos momentos, muitos pensamentos e então, suponho, tudo se tornará mais claro. Isto se nós ficarmos satisfeitos. Porque se um dia descobrimos uma realidade e a julgámos à luz dos nossos conceitos prévios e se cometemos o erros de não os revermos, pode essa realidade não existir, ou existir diferente. No fundo, suponho que podemos afirmar: que apenas nos devem ofender as mentiras importantes. Todas as outras são parte desse mistério e ocorrem de acordo com a natureza. Como se viver, ou entender, fosse uma ciência que requer o seu método: não acreditar na permanência daquilo que hoje vemos, mas amar aquilo que conhecemos e, claro, amar a dúvida e a descoberta. Será que amar o objecto de estudo ainda é tabu nas ciências? Creio que sim, uma pena. Adiante.
Hoje sei apenas mais algumas coisas, no meio de um monte de dúvidas mas isso é interessante, talvez amanhã novas respostas surjam ou novas perguntas, ou nada. Tudo isto é muito interessante. No fundo, creio não estar a mentir quando digo que sei mais qualquer coisa, mas nem por isso assumo o conhecimento da história daquilo que sei. Entrevejo, sendo que esta é a forma mais intrigante de ver. Uma coisa triste é que pelo caminho ainda acabámos a magoar os outros, um pouco involuntariamente, e deixamos escapar tantas vezes a oportunidade de dizer: gosto de ti.
Tantas letras, isto é o que digo quando olho para o ecrã cheio.
Que coisa parva para se fazer ao domingo à noite. Podia resumir o post a algumas ideias que passaram repentinamente pela minha cabeça este fim-de-semana: preocupa-me a erosão da ideia de memória; a propósito, a crónica do M. António Pina na Visão da semana passada é soberba. Lá vou eu ter que falar da memória, que a par das palavras, constitui quase a totalidade deste blog. Ainda há o amor, mas isso é tudo, suponho. Sobre a memória ocorre-me muitas vezes perguntar se as pessoas ainda sabem o que é. Hoje lembrei-me que no século passado a memória se cristalizou na forma de ícone, perdendo o significado daquilo que se recorda e vivendo apenas do seu próprio significado que se modifica através do decorrer do tempo. Ou seja, era ainda manhã, era domingo, e eu a transformar-me num iconoclasta. Claro que depois fui almoçar. Aliás, com a memória acontece a mesma coisa: pode esperar. Talvez por isso nos sentemos a lembrar alguma coisa e logo desistimos e começamos a fazer qualquer outra coisa, porque a memória está lá, pode esperar. Claro que depois morremos, mas isso são pormenores. Outra coisa que nos preocupa é a memória de nós depois de morrermos, a mim sempre me pareceu ridículo. Como aquela história que se conta do funeral do Sá-Carneiro. A história é decerto inventada e aliás demonstra um sadismo incrível. É como eu com a mania de falar de histórias que ninguém conhece e depois não as contar. Mas olhem que isto já é abusar. A página do Word já acabou e admito que ninguém vai conseguir ler isto de uma ponta à outra. E se ler certamente acabará por me insultar por gastar tantas letras, e tanto do precioso tempo do leitor, num emaranhado de frases desconexas. Como diz uma amiga minha: eu devia era estar a ver a Quinta das Celebridades e deixar-me de tretas.

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