sublinhar

terça-feira, setembro 30, 2003

Parêntesis

Acho tão natural que não se pense
Que me ponho a rir às vezes, sozinho,
Não sei bem de quê, mas é de qualquer cousa
Que tem que ver com haver gente que pensa ...

Que pensará o meu muro da minha sombra?
Pergunto-me às vezes isto até dar por mim
A perguntar-me cousas. . .
E então desagrado-me, e incomodo-me
Como se desse por mim com um pé dormente. . .

Que pensará isto de aquilo?
Nada pensa nada.
Terá a terra consciência das pedras e plantas que tem?
Se ela a tiver, que a tenha...
Que me importa isso a mim?
Se eu pensasse nessas cousas,
Deixaria de ver as árvores e as plantas
E deixava de ver a Terra,
Para ver só os meus pensamentos ...
Entristecia e ficava às escuras.
E assim, sem pensar tenho a Terra e o Céu.

Alberto Caeiro

segunda-feira, setembro 29, 2003

Memória (da tua presença) - Memória (na tua ausência)

Ausência

Deixa secar no meu rosto
Esse pranto de amor que a presença desatou
Deixa passar o desgosto
Esse gosto da ausência que me restou
Eu tinha feito da saudade
A minha amiga mais constante
E ela a cada instante
Me pedia pra esperar

E foi tudo o que eu fiz, te esperei tanto
Tão sozinha no meu canto
Tendo apenas o meu canto pra cantar
Por isso deixa que o meu pensamento
Ainda lembre um momento a saudade que eu vivi
A tua imagem fiel
Que hoje volta ao meu lado
E que eu sinto que perdi


Vinicius de Moraes
in Poesia completa e prosa: “Cancioneiro”

domingo, setembro 28, 2003

Outro domingo



Hoje é domingo - (amanhã também?)

Domingo irei para as hortas na pessoa dos outros,
Contente da minha anonimidade.
Domingo serei feliz — eles, eles...
Domingo...
Hoje é quinta-feira da semana que não tem domingo...
Nenhum domingo. —
Nunca domingo. —

Mas sempre haverá alguém nas hortas no domingo que vem.
Assim passa a vida,
Subtil para quem sente,
Mais ou menos para quem pensa:
Haverá sempre alguém nas hortas ao domingo,
Não no nosso domingo,
Não no meu domingo,
Não no domingo...
Mas sempre haverá outros nas hortas e ao domingo!

Álvaro de Campos

sábado, setembro 27, 2003

Memória Imediata: Raul Seixas

(...)
eu devia estar contente por ter conseguido tudo que eu quis
mas confesso, abestalhado, que eu estou decepcionado
porque foi tão fácil conseguir, e agora eu me pergunto: e daí?
eu tenho uma porção de coisas grandes prá conquistar
e eu não posso ficar aqui parado

eu devia estar feliz, pelo senhor ter me concedido o domingo
prá ir com a família no jardim zoológico dá pipoca aos macacos
ah! mas que sujeito chato, eu sou, que não acha nada engraçado
macaco, praia, carro, jornal, tobogã eu acho tudo isso um saco

é você se olhar no espelho, se sentir um grandessíssimo idiota
saber que é humano, ridículo, limitado, e que só usa 10% de sua cabeça animal
e você ainda acredita que é um doutor, um padre, um policial.
que está contribuindo com a sua parte para o nosso belo quadro social

eu é que não me sento num trono de um apartamento
com a boca escancarada, cheia de dentes, esperando a morte chegar
porque longe das cercas embandeiradas que separam quintais
no cume calmo do meu olho que vê
assenta a sombra sonora de um disco voador

Ouro de Tolo
(Raul Seixas)

No leitor de CD’s: Marisa Monte

A gente não quer só comida
A gente quer comida, diversão e arte
A gente não quer só comida
A gente quer saída para qualquer parte

Comida
(Arnaldo Antunes/Sérgio Britto/Marcelo Fromer)

sexta-feira, setembro 26, 2003

Ler

“Insensivelmente contraíra o mais delicioso hábito do mundo, o hábito da leitura: ignorava que construíra assim um refúgio para as amarguras da vida; ignorava também que estava criando um mundo irreal que transformaria o mundo real quotidiano numa fonte de cruéis decepções.”

in Servidão Humana, W. Somerset Maugham

quinta-feira, setembro 25, 2003

A eterna luta contra o template

Um erro no código html de um dos links levou ao desaparecimento temporário de grande parte da lista de links e dos arquivos do Sublinhar. A situação já está resolvida, mas alguns dos links desaparecidos só podem regressar quando eu tiver acesso à pasta de favoritos do meu pc.
O indicador do sitemeter foi para o fundo da página porque aparentemente interfere com a visualização da página em alguns sistemas operativos.

Link (2)

Para quem ainda não sabe: A obra de Vinicius de Moraes está disponível on-line.

Conselho de amigo

Ontem encontrei uma amigo que já não via há muito tempo. Está desempregado há já um ano, desde que terminou a licenciatura (a mesma que eu). Depois de eu lhe ter dito que estava quase a acabar o curso, disse-me:
“ Não acabes já. Não vale a pena. Não vais encontrar emprego. Disfarça, e vai ficando por aqui mais algum tempo.”
A verdade é que só um optimismo infundado me leva a não seguir este conselho.

A propósito de todas as guerras

“Quando rebenta uma guerra, as pessoas dizem: “Não pode durar muito, seria estúpido.” E, sem dúvida, uma guerra é muito estúpida, mas isso não a impede de durar. A estupidez insiste sempre, e compreendê-la-íamos se não pensássemos sempre em nós. Os nossos concidadãos, a esse respeito, eram como toda a gente: pensavam em si próprios. Por outras palavras, eram humanistas: não acreditavam nos flagelos. O flagelo não está à medida do Homem; diz-se então que o flagelo é irreal, que é um mau sonho que vai passar. Ele, porém, não passa e, de mau sonho em mau sonho, são os homens que passam, e os humanistas em primeiro lugar, pois não tomaram as suas precauções. Os nosso concidadãos não eram mais culpados que os outros. Apenas se esqueciam de ser modestos e pensavam que tudo ainda era possível para eles, o que pressupunha que os flagelos eram impossíveis. Continuavam a fazer negócios, preparavam viagens e tinham opiniões. Como poderiam ter pensado na peste, que suprime o futuro, as viagens e as discussões? Julgavam-se livres, e nunca alguém será livre enquanto existirem flagelos.”

in A Peste, Albert Camus

Um vício?

Na terça-feira resolvi enviar o meu pc a um técnico para resolver uma virose que já durava há alguns meses. Pensei, erradamente vejo agora, que uma semana sem actualizar o blog não me faria qualquer diferença. Mas hoje cá estou, utilizando um computador de um amigo, incapaz de resistir a colocar aqui alguns sublinhados.

terça-feira, setembro 23, 2003

Ecce Homo

Desbaratamos deuses, procurando
Um que nos satisfaça ou justifique.
Desbaratamos esperança, imaginando
Uma causa maior que nos explique.
Pensando nos secamos e perdemos
Esta força selvagem e secreta,
Esta semente agreste que trazemos
E gera heróis e homens e poetas.
Pois Deuses somos nós. Deuses do fogo
Malhando-nos a carne, até que em brasa
Nossos sexos furiosos se confundam,
Nossos corpos pensantes se entrelacem
E sangue, raiva, desespero ou asa,
Os filhos que tivermos forem nossos.

José Carlos Ary dos Santos

segunda-feira, setembro 22, 2003

Diálogo com o futuro

Partilho as esperanças e inquietações desta Carta para o futuro.

Novo Link

Releituras
Destaco L.F. Veríssimo, mas há mais…muito mais.

domingo, setembro 21, 2003

Fim-de-semana


O Pianista


About a boy


Sin Noticias de Dios


Hable con ella

Dois apontamentos

Nos nossos dias, um dos maiores perigos para a democracia representativa é a falta de credibilidade dos políticos junto da opinião pública. Este é um fenómeno que tem larga tradição mas, parece-me, ganhou nova dimensão com o mediatismo e a demagogia em que assenta todo (ou quase todo) o discurso político da actualidade.
É por isso que não compreendo a reacção (ou melhor, a inacção) dos partidos políticos em casos em que actuações individuais contribuem para esse descrédito. Seja no caso das viagens de trabalho a Sevilha, seja no mais recente caso da doente deputada Maria Elisa, os partidos políticos são incapazes de reagir com a firmeza que os actuais índices de abstencionismo e desinteresse da população exigem, permitindo, que por sua omissão, o mau comportamento de alguns leve ao aumento do descrédito por toda a classe política.

Em Portugal, todos os intervenientes do sistema judicial, desde os juízes aos funcionários judiciais passando pelos advogados e pelo MP, tem como norma agir e pensar de forma corporativista. Felizmente nem todos seguem esta lógica e entre essas excepções está o Juiz – Desembargador Eurico Reis (as suas crónicas na Visão e as suas intervenções na SIC – Noticias são obrigatórias)

sábado, setembro 20, 2003

Nós, os pouco felizes

Nós, os seres humanos que vivemos em casas ou apartamentos, e não em acampamentos nem nos viadutos, nem nas favelas ou nos hospícios, nós que vivemos em residências de cujas janelas podemos ver a cidade em seus ofícios e vícios, ou as paisagens do campo e suas luzes, nós que sabemos cantar em prosa e verso, que podemos andar, sorrir, comer, temos a indústria e o comércio, e conta nos bancos, universitários, que nunca fomos à guerra ou despejámos mísseis, nós que podemos ver o mar, as ilhas, as aves, as montanhas, o céu belíssimo, as nuvens pretas, as estrelas, a amplidão do mundo, que temos mapas e a astronomia, médicos e anestesia, hospitais e poesia, que podemos viajar, olhar vitrines e comprar, nós, ai, nós, que sabemos ler e lemos livros, temos fogões em nossas casas, temos camas, temos sexo e desejo, temos o beijo, nós que ouvimos música no rádio ou em discos, que temos filhos com todos os dentes, escola, agasalho e nem vivemos em Cuba, nós que não somos curdos, nem etíopes nem angolanos, que temos florestas imensas, rios, terras, temos seca e temos chuva, temos quadros e gravuras, o luar do sertão e as araras, que choramos no cinema, que temos alma e lágrimas, mil caras, uma só, dedos sensíveis e crenças, amores secretos, jornalistas altruístas, padres guerrilheiros, músicos ardentes, escritores, sindicalistas, líderes sem-terra à vista, violeiros repentistas, loucuras, alvará de soltura, uma terra com palmeiras onde canta o sabiá, que temos carro ou sapato sem furo, temos o passado e o futuro, nós que assinamos revistas e jornais, temos casa de campo, mesmo que seja de um amigo onde há cavalos e pirilampos, nós que jantamos à luz de velas, tomamos vinho e meio embriagados lemos poemas para os passarinhos, ou para as belas mulheres, ou para o ser que amamos, e amamos vários, nós que somo amados, que vamos à praia ou não vamos mas esperamos a praia vir a nós, que vestimos roupas e usamos um antigo anel de família que ainda não foi roubado, e que talvez nunca seja, que tomamos cerveja, que temos a confissão e o perdão, que acordamos tarde e não andamos de trem, que temos salário, ou renda fixa, emprego, família, paixão, nós que temos corpo e estamos vivos, temos amigos, temos trabalho, fazemos exercícios, somos hedonistas, artistas, poucos, nós que fazemos cinema, que sentimos o perfume e temos sonhos, que adoramos ouvir estórias contadas por qualquer estranho, que dançamos alegres com as crianças, que gostamos de lareira e frio, sorvete e calor, o limpo e o macio, que sonhamos navegar tornando o mundo pequeno, que usamos biquínis e tangas, desfilamos nossos seios nus nas escolas de samba, que não somos da ralé nem da choldra, nem da rafaméia nem do lúmpem nem da miséria, que especulamos e ganhamos mas também perdemos, nós que temos raízes, directrizes, teatro, damas atrizes, jogadores, senadores, ai de nós, perdoai-nos, somos os pouco felizes.

Ana Miranda

Texto retirado da revista Ler (Verão de 1999).
Publicado originalmente na revista Caros Amigos em 1999

sexta-feira, setembro 19, 2003

Nocturno (Itinerário construído com palavras)

Eu…

Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada… a dolorida…
(…)
Florbela Espanca

Lisbon Revisited (1926)

Nada me prende a nada.
Quero cinquenta coisas ao mesmo tempo.
Anseio uma angústia de fome e carne
O que não sei o que seja –
Definidamente pelo indefinido…
Durmo irrequieto, e vivo num sonhar irrequieto
De quem dorme irrequieto, metade a sonhar.
(…)
Álvaro de Campos, in Ficções do Interlúdio (Assírio & Alvim)

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arrasto comigo o cheiro amargo da memória
mascaro os dias com palavras cujo significado perdi
mas nenhuma felicidade vem alojar-se no coração

o mundo que te rodeou continua inaudível e perdido
apodrece nas fotografias arrumadas dentro da gaveta
debaixo da roupa engomada

o aparo da caneta imobiliza por trás de cada palavra
o som dos poucos objectos com que partilhámos a vida

fica com as máscaras de tinta a morderem-te a noite
eu parto para qualquer país onde não exista
Al Berto, in O Medo (Contexto)

Pensamentos soltos (1)

Basta uma manhã na universidade e fico com vontade de reler um livro de Tom Sharpe.

O Poeta

Triste, lá vai à ronda dos segredos
O maluco que rouba quanto vê
Branco, do coração aos dedos,
É todo antenas onde apenas lê.

Murcha-lhe nos pés o rosmaninho
E a própria rosa, de o sentir, descora:
Mas é um Deus que passeia o seu caminho
A beber a amargura de quem chora.

Magro, lá passa, e lá se vai consigo
A luz das coisas e a flor de tudo
É um bruxo lento, tenebroso e antigo,
Pálido, sério, solitário e mudo.

Miguel Torga
in Diário Vols. I a VIII(Dom Quixote)

quinta-feira, setembro 18, 2003

Pour ne pas vivre seul

Pour ne pas vivre seul
On vit avec un chien
On vit avec des roses
Ou avec une croix
Pour ne pas vivre seul
On 'sfait du cinéma
On aime un souvenir
Une ombre, n'importe quoi
Pour ne pas vivre seul
On vit pour le printemps
Et quand le printemps meurt,
Pour le prochain printemps
Pour ne pas vivre seul
Je t'aime et je t'attends pour avoir l'illusion
De ne pas vivre seule, de ne pas vivre seule
(…)
(D Faure/G. Kelly)

8 Mulheres

Oito actuações excelentes, um argumento muito bom (com ritmo, humor e bons diálogos), realização impecável (luz, cor, o movimento das actrizes em cena) e até a música é bem escolhida e em doses equilibradas.
Destaque para Emmanuelle Béart, simplesmente perfeita.

Ingrid Betancourt

Ingrid Betancourt e Clara Rojas continuam sob sequestro das FARC.
A Natureza do Mal e o Respirar o mesmo ar associam-se a uma campanha mundial que tem um objectivo simples: falar delas como forma de garantir a sua segurança e a sua libertação.

Vivemos num mundo sem memória do passado e, aparentemente, já sem memória do presente.
Por mim, continuarei com muitas palavras contra o esquecimento.

PS: Eu já tinha falado de Ingrid Betancourt aqui, e continuarei a falar sempre.

quarta-feira, setembro 17, 2003

“The Man Who Knew Too Much” (1956)

Até Hitchcock é capaz de nos desiludir. O filme é desnecessariamente longo e o final muito previsível e fastidioso.
Resta-nos a Doris Day como consolação.

terça-feira, setembro 16, 2003

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Alguns têm na vida um grande sonho e faltam a esse sonho. Outros não têm na vida nenhum sonho, e faltam a esse também.

in Livro do Desassossego, Bernardo Soares
(Assírio & Alvim)

segunda-feira, setembro 15, 2003

Fotografia do dia

GRETA GARBO. Photograph by Arnold Genthe. [1925.]
From the Collections of the Library of Congress
(Location: Unprocessed
Reproduction Number: LC-USZ62-35207)

Dois lugares a (re)visitar ainda em Setembro

Serralves
O Paço

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Quanta incerta esperança, quanto engano!
Quanto viver de falsos pensamentos,
Pois todos vão fazer seus fundamentos
Só no mesmo em que está seu próprio dano!

Na incerta vida estribam de um humano;
Dão crédito a palavras que são ventos;
Choram depois as horas e os momentos
Que riram com mais gosto em todo o ano.

Não haja em aparências confianças;
Entendei que o viver é de emprestado;
Que o de que vive o mundo são mudanças.

Mudai, pois, o sentido e o cuidado,
Somente amando aquelas esperanças
Que duram pera sempre co'o amado.

Luís Vaz de Camões
(Texto obtido em www.instituto-camoes.pt)

Três percursos traçados no mapa

1º - (de carro)
Boston – Nova Iorque – Filadélfia – Washington D.C.

2ª - (de comboio)
São Petersburgo – Moscovo – Vladivostok

3º - (de barco)
Lisboa – Buenos Aires

domingo, setembro 14, 2003

Um mundo (outro)

Estava capaz
De apagar o passado
E tudo aquilo que fiz
E mergulhar
Onde o mar é mais fundo
Desejar o que sempre quis
(..)
Estava capaz
De não querer desistir
Do sonho que a vida desfez
Torná-lo real
E nele acordar
Como se fosse a primeira vez

Este mundo e um outro, Rádio Macau
in O rapaz do trapézio voador

sábado, setembro 13, 2003

Escravos

(…)“Durante três anos, foi mais uma dos cerca de 27 milhões de homens, mulheres e crianças escravizados em todo o mundo – isolados ou fisicamente restringidos, obrigados a trabalhar, controlados por meio de violência ou de alguma forma tratados como propriedade de alguém.”

Texto: Andrew Cockburn / Fotografias: Jodi Cobb
in National Geographic Portugal (Setembro, 2003)


“Portugal is primarily a destination country for trafficked persons from Ukraine, Moldova, Russia, Romania, Lithuania, and Belarus, as well as Brazil, Angola and Cape Verde, for the purposes of forced and exploited labor of men and to a lesser extent, sexual exploitation of women. There is some evidence of internal trafficking of children from boarding schools and orphanages by an organized pedophilia ring, currently under investigation. Other trafficked persons transit mainland Portugal en route to the United Kingdom and other European countries.”

in Relatório do Departamento de Estado dos EUA sobre tráfico de seres humanos – 2003


Artigo 4
Ninguém será mantido em escravatura ou em servidão; a escravatura e o tráfico de escravos, sob todas as formas, são proibidos.
Declaração Universal dos Direitos Humanos

sexta-feira, setembro 12, 2003

Sempre sublinhado

Artigo 1:
Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos.
……

quinta-feira, setembro 11, 2003

………………

“São como um cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.

Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam;
barcos ou beijos,
as águas estremecem.

Desamparadas, inocentes,
leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.

Quem as escuta? Quem
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas conchas puras?”

As palavras, Eugénio de Andrade
in O Sal da Língua precedido de Trinta Poemas

………………

“escrevo-te a sentir tudo isto
e num instante de maior lucidez poderia ser o rio
as cabras escondendo o delicado tilintar dos guizos nos sais de prata da fotografia
poderia erguer-me como o castanheiro dos contos sussurrados junto ao fogo
e deambular trémulo com as aves
ou acompanhar a sulfúrica borboleta revelando-se na saliva dos lábios
poderia imitar aquele pastor
ou confundir-me com o sonho de cidade que a pouco e pouco morde a sua imobilidade

habito neste país de água por engano
são-me necessárias imagens radiografias de ossos
rostos desfocados
mãos sobre corpos impressos em papel e nos espelhos
repara
nada mais possuo
a não ser este recado que hoje segue manchado de finos bagos de romã
repara
como o coração de papel amareleceu no esquecimento de te amar”

”Trabalhos do olhar”, Al Berto
in O MEDO (Contexto,1991)

Uma vida = 500 euros

"Então pagar 500 euros para mandar matar a mãe é coisa que se faça?", questiona uma vizinha, incrédula. "Não, não é. E nem sequer se entende o porquê", limita-se anuir, cabisbaixo, o neto da falecida e filho da confessa mandante do crime. Joaquim, 30 anos, ouve agora a história da sua família em cada esquina de Valbom, em todos os cafés da rua. E enfrenta com resignação, "pois, é o remédio" e com a frontalidade de quem "não tem nada a esconder", mas também de quem "pouco ou nada consegue explicar".

Por Luísa Pinto, Público (11/09/2003)

...

"O que é que provoca esta guerra? Não é a pobreza, nem a exploração colonial, nem o esmagamento da identidade de nações, nem a globalização, mas a percepção tida, após 1989, da vitória potencial da democracia e do capitalismo no plano global. Contra essa vitória percebida, ergue-se uma combinação trágica, mas que não se pode ocultar por motivos "politicamente correctos", de uma deriva religiosa e social que envolve o fundamentalismo islâmico."

José Pacheco Pereira, Público (11/09/2003)

Sublinhar

1. Traçar uma linha por baixo de uma ou mais palavras, realçando-as. 2. Acentuar, fazer sobressair com a entoação, o gesto, a cor, etc. 3. Pôr em destaque; realçar; salientar.

E depois do adeus

Tem razão o Pedro ao pedir um porquê para o fim deste blog. Ontem, ao acabar abruptamente este blog, não tinha uma explicação definida para o seu fim sabia, apenas, que devia terminar. Hoje, reflectindo sobre isso, encontro muitas explicações: este blog parece-me sempre à beira de uma linha que não consegue ultrapassar (nem eu quero que ultrapasse); nos últimos dias tenho a sensação que a proximidade do pc me afasta todos os posts que tenho no pensamento, logo, não os chego a escrever; e, por último e talvez mais importante, apetece-me mais pensar do que ter opiniões (o que não é a mesma coisa embora muitas pessoas pensem que é).

Também o Submerso está certo quando me diz para não desistir. Não vou desistir mas apenas divergir do caminho seguido até aqui.

Apetece-me um blog onde possa juntar todos os sinais que me chegam do mundo: o romance que estou a ler; os jornais do dia ou do século passado; as revistas; a televisão; a música que ouço na rádio; o poema de que me lembro na rua sem saber porquê; o livro de história que relembro porque a realidade faz com que me lembre; a conversa que ouço no café; as coisas que os amigos me dizem.
O mundo, o meu mundo, em fragmentos sublinhados por mim.

[in Intervalo Doloroso]

quarta-feira, setembro 10, 2003

Fim

Este blog termina aqui.
Talvez em breve inicie outro, talvez não.
Certo é eu continuar a ler o que se escreve nos outros blogs.

Fiquem bem e obrigado pelas visitas.

[in I.D.]

terça-feira, setembro 09, 2003

...

“Foi depois de uma dessas inspecções que Clara se viu sem reservas para a espera, o risco diário. Tinha o marido e um filho adolescente em Brinnlitz, mas agora pareciam-lhe mais distantes que os canais do planeta Marte. Não conseguia imaginar Brinnlitz, ou eles lá. Cambaleava pelo campo das mulheres, à procura dos fios eléctricos. (..)
(…) Quando viu uma conhecida de Plaszów, uma mulher de Cracóvia como ela, Clara saltou-lhe para a frente: “Onde fica a cerca electrificada?”, perguntou-lhe. Para o seu cérebro perturbado, era uma pergunta razoável, e Clara não tinha a menor dúvida que a amiga, caso não tivesse algum sofrimento fraternal, iria indicar-lhe o caminho preciso para a cerca. A resposta que a mulher deu a Clara era igualmente louca, mas tinha um ponto de vista fixo, um equilíbrio, um núcleo perversamente são.
“Não te mates contra a cerca, Clara”, disse-lhe a mulher. “Se o fizeres, nunca saberás o que aconteceu.”

in A Lista de Schindler, Thomas Keneally

[in I.D.]

domingo, setembro 07, 2003

...

“- Genia, eu conheço a tua mãe, Eva. Ela e eu costumávamos ir comprar roupas juntas e ela comprava-me bolos na pastelaria da Rua Bracka.
A criança manteve-se sentada, não sorriu, olhou em frente.
- Minha senhora, está enganada. O nome da minha mão não é Eva. É Jasha.
Continuou a desfiar os nomes da geração polaca fictícia que os pais e os camponeses lhe haviam ensinado para o caso de alguma vez ser interrogada pela Polícia Azul ou pelas SS. A família entreolhou-se, franzindo as sobrancelhas, emudecida pela invulgar sagacidade da criança, achando-a obscena, mas sem a querer minar, dado que poderia, em menos de uma semana, ser um equipamento essencial de sobrevivência.”

in A Lista de Schindler, Thomas Keneally

[in I.D.]

sábado, setembro 06, 2003

A propósito do post anterior

Mas não faz mal, é sábado, o dia está agradável, acho que vou aqui e à noite aqui.
Até amanhã.

[in I.D.]

Blogger

Hoje é mais um daqueles dias engarrafados em que não consigo o acesso a nenhuma página alojada neste servidor. Pelo menos ainda dá para colocar posts, acho eu.
Sei que não é muito justo reclamar de uma empresa que me presta um serviço sem que eu lhe pague nada, mas ainda assim...

[in I.D.]